Os medos que ainda ficam após a alta médica

por Oncocentro Curitiba

Em cerca de metade dos cancerosos, o tumor maligno desaparece para sempre, após o tratamento. Mas o ex-paciente pode ser prejudicado pelo medo de a cura não ser completa e pela discriminação, já que muita gente ainda encara a doença como sentença de morte.

Em média, seis em cada dez crianças cancerosas conseguem vencer a doença a incidência pode ser maior, dependendo do tipo de tumor maligno. Em adultos, as chances de cura crescem com o aparecimento de novas técnicas de diagnóstico e tratamento. No entanto, quando se põe um ponto final na história do câncer, outra história está apenas começando. O medo que envolve a doença pode dobrar justamente no dia da alta médica. É como se, abandonando a quimio e radioterapia, a pessoa estivesse sendo devolvida à fera do câncer.

O receio dos pacientes fora de tratamento é justificável: afinal, de tempos em tempos, eles têm de fazer exames de controle. Alguma célula cancerosa pode ter escapado do órgão de origem, instalando-se em outro canto do corpo, para ali recomeçar a sua reprodução desenfreada, típica da doença. Os médicos sabem, porém, que se um câncer não voltar em três anos, as chances de recidivas serão muito pequenas e, depois de cinco anos, poderá se falar em cura. Esse período costuma ser vivido de maneira estressante.

Nas vésperas dos exames, a tensão é impressionante. O que ajuda é evitar parar de trabalhar. Nem sempre, porém, isso é possível. Infelizmente, é comum ex-pacientes ou porque o tratamento os obrigou a faltar ao trabalho ou porque são vistos como condenados à morte perderem emprego ou ficarem encostados na empresa, sem esperança de promoção.

No caso das crianças, os serviços médicos costumam fazer de tudo para que não percam o ano letivo: Os professores entregam as provas e as lições, enquanto a criança está internada. Mais tarde, as escolas são orientadas no sentido de não discriminarem essas crianças, até porque não há motivos. Em populações mais carentes, um problema difícil de lidar é o do emprego dos pais. É aconselhável que alguém da família permaneça ao lado do paciente, nas penosas sessões de quimioterapia. Muitas vezes, a mãe não pode deixar os outros filhos sozinhos em casa. O pai, então, falta ao serviço. Depois, muitas vezes, a criança se torna uma paciente bissexta, porque o pai teme o desemprego. Sem tratamento adequado, ela perde as chances de cura.

Um estudo feito pelo Instituto Nacional do Câncer com 2 940 pessoas ex-pacientes ou parentes de ex-pacientes revela que um terço delas tem alguma sequela da doença na vida profissional. A pesquisa levou em consideração o caso de pessoas que preferem esconder no ambiente de trabalho que foram doentes de câncer.

Sabe-se que, no caso das crianças, a cura pode ser absoluta. Mesmo assim, quando se tornam adultos competentes e saudáveis, essas pessoas muitas vezes omitem que tiveram câncer, nos testes de seleção, porque senão costumam ser preteridas. O estigma da palavra câncer ainda é terrível.

Problemas como esse induzem ex-pacientes a calar sobre o seu passado. Nem sempre é fácil comentar que se teve câncer: A pessoa costuma ouvir um comentário piedoso ou é tratada com atenções especiais. Nada é pior para baixar o astral. O ser humano detesta ser subestimado. Além disso, a palavra câncer passa a ser predicativo do ex-paciente nos cochichos, ele é o fulano que aliás teve câncer.

A morte é um conceito cercado de mistérios. E, quando se está diante de alguém que teve câncer, estamos de frente a uma pessoa que já experimentou a morte, não se refere à morte física: Morre com o tumor uma série de manias, conceitos, convicções. Todos saem transformados, de um jeito ou de outro. Existem pessoas, segundo Lúcia, que parecem fazer um pacto com a vida olham para os lucros da experiência, ficam mais animadas do que antes, passam a valorizar mais o cotidiano e seus sonhos. Outras, porém, amargam as perdas e danos da doença. Estas, de certo modo, acabam derrotadas pelo câncer, mesmo que se curem.

 

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